EDUCAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE: ESTRATÉGIA PARA EMPRESAS DO SÉCULO XXI
Education for sustainability: strategic FOR COMPANIES IN XXI Age’s
MUNHOZ, D. “ Educação para a Sustentabilidade: Estratégica para Empresas do Século XXI” IN: Revista Sinais Sociais, SESC|Serviço Social do Comércio, Rio de Janeiro, v. 18, Ano 6, p. 48-77, jan-abril de 2012
RESUMO
A Educação para a Sustentabilidade é um processo de desenvolvimento da cultura de sustentabilidade necessário à transformação dos processos produtivos de empresas que pretendem sobreviver no futuro. Na perspectiva da autora, o termo Educação para a Sustentabilidade é mais adequado para o trabalho voltado para o público interno, enquanto a Educação Ambiental é mais adequada para os trabalhos com a comunidade. Há também diferenças de abordagem, foco, metodologia de trabalho entre os dois conceitos. Seis aspectos são considerados fundamentais para um programa de Educação para a Sustentabilidade de sucesso: o negócio da empresa, a legislação vigente, os valores humanos, a abordagem técnico-científica, o tempo e o espaço.
Palavras-chave: educação para a sustentabilidade; produção mais limpa; liderança; educação ambiental para empresas; alfabetização ecológica
Education for Sustainability is a development process of the sustainability culture, required for the transformation of the productive processes of companies that intend to survive in the future. From the author’s perspective, the term Education for Sustainability is best suited for the work geared to companies, while environmental education is best suited for community projects. There are also differences in approach, focus and work methodology between them. There are six aspects considered essential for a successful Education for Sustai- nability program: the company’s business, the current law, human values, the scientific-technical approach, time and space.
Keywords: education for sustainability; cleaner production; leadership; corpo- rate enviromental education; ecoliteracy
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São seis os aspectos que considero importantes para um programa de sucesso: negócios, técnico-científico, legislação, valores humanos, tempo e espaço.

A Educação para a Sustentabilidade precisa ser fortemente orientada para o negócio da empresa, para sua missão, para sua razão de existir. Sem considerar esses aspectos, os responsáveis pelo desenvolvimento dos programas ambientais terão maiores dificuldades em transformar a empresa sem quebrá-la ou enfrentar grandes resistências internas. Assim como recomendo que os projetos observem esses pontos, recomendo também que os profissionais interessados em atuar com Educação para a Sustentabilidade junto ao segmento empresarial desenvolvam habilidades nas mesmas dimensões anteriormente citadas.
- O que devemos e queremos mudar?
- Que oportunidades daremos aos nossos emprega- dos para que façam na prática aquilo que aprenderam dentro e fora da empresa?
- Como vamos monitorar a mudança comportamental?
- Que indicadores objetivos poderemos usar?

Certa vez, durante a realização de um curso piloto de EdS em uma importante indústria automobilística, constatei juntamente com um colega de trabalho, o contínuo cheiro de ácido em uma parte das dependências da produção. Participaram do curso parte da equipe de SGA e empregados da linha de produção. Enquanto o pessoal da produção se debruçou sobre o exercício para resolvê-lo, as lideranças de SGA, de braços cruzados, batiam papo na maior parte do tempo. Que mensagem esses engenheiros estavam passando para suas equipes de trabalho? Esse é um bom exemplo de linguagem não verbal.
Em seguida, durante a apresentação dos aspectos e impactos ambientais da atividade de determinado setor, um empregado comentou sobre o vazamento de ácido que eu também tinha percebido durante a visita. Imediatamente um dos líderes do SGA rebateu a explanação precisavam de um equipamento que ainda não tinham comprado e disse que a empresa não poderia lançar o gás para fora, pois criaria um problema ambiental.Que mensagem ele enviou para o funcionário e sua equipe, assim como para os consultores presentes?
Frases não ditas, comportamentos e linguagem corporais são poderosas fontes de informação na condução de Programas de Ambientais. O setor de limpeza e manutenção tem pontos de vista importantíssimos sobre o comportamento das pessoas e podem contribuir com excelentes sugestões devido ao tipo de trabalho que têm na organização. Como uma empresa implanta um SGA sem a legítima participação de sua equipe de produção no levantamento de aspectos e impactos ambientais?
Esse tipo de participação contribui para o desenvolvimento da visão sistêmica, do pensar coletivo e da ação em rede. A não participação gera os chamados procedimentos que não funcionam ou que são feitos para não serem cumpridos, exceto durante as auditorias. Isso contribui para o estresse da equipe técnica em véspera de auditoria.Muitas das respostas a problemas enfrentados pelas empresas poderão ser dadas pelas próprias equipes de trabalho, a exemplo dos chamados Ecotimes na implantação de Programas de Produção Mais Limpa.
Durante um projeto de Produção Mais Limpa que executei em uma fábrica de borracha, um dos problemas levantados pelo Ecotime foi a desordem dos banheiros masculinos utilizados todos os dias pelos empregados para tomar banho. A responsável pelo serviço de limpeza comentou que a quantidade de água usada era muito grande e que o vestiário era deixado muito bagunçado. A maior causa do consumo de água era o fato da empresa não ter um filtro necessário para conter o fino pó de negro de fumo que era liberado durante a fabricação da borracha. Os empregados trabalhavam de blusa de manga comprida debaixo de um macacão e mesmo assim o pó impregnava seus corpos debaixo da roupa.
O discurso do banho rápido não tinha sentido uma vez que a própria empresa não possibilitava uma condição mínima de higiene corporal. Alem disso, toda a roupa dos funcionários era lavada em suas casas, por suas esposas. Roupas que servem ao trabalho de empresas particularmente com esse tipo de atividade devem ficar sob a responsabilidade da empresa. Isso evita a contaminação de outras roupas da família, tais como peças íntimas femininas ou de crianças que por ventura possam ser colocadas junto com os uniformes. Além do mais, é um exemplo de externalidade: a empresa externaliza os custos da lavagem de uma roupa que sujou por incompetência dela em gerenciar seus resíduos, assim como parte da poluição que vai dos uniformes para o esgoto doméstico do empregado. A geração de resíduos está muito associada a questão de gênero. Geralmente os homens sujam duplamente: a empresa e suas roupas e as mulheres – esposas, mães, ou empregadas da limpeza, limpam.
4.1. Experiência de Formação de Facilitadores Internos de Produção Mais Limpa na indústria do Couro
O desenvolvimento de um projeto de Produção Mais Limpa para a Indústria do Couro, em 2001, teve como intenção a adoção de uma estratégia econômica, ambiental e tecnológica integrada aos processos e produtos buscando aumentar a eficiência no uso de matérias-primas, água e energia. Esse aumento de eficiência é acompanhado da não geração, minimização ou reciclagem de resíduos gerados em todos os setores produtivos, com benefícios ambientais e econômicos para a empresa. Trata-se da incorporação de uma filosofia de fazer mais com menos, procurando sempre identificar o por quê da geração dos resíduos.
O projeto foi realizado dentro de um contexto que buscou o desenvolvimento da Indústria do Couro em Minas Gerais com menor impacto ambiental. Esse projeto teve como referência a pesquisa realizada pela Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais – FIEMG, conjuntamente com o Instituto Metas – Projeto Cresce Minas, que enfatizou os aspectos econômicos e conjunturais da produção de couro no estado. Minha participação neste projeto ocorreu num primeiro momento como coordenadora geral e responsável pela formação dos 17 facilitadores internos de P+L. Num segundo momento, como consultora de um curtume e uma acabadora de couro.
Para facilitar o processo de implantação do projeto dentro das empresas, desenvolvi um curso básico para a formação de facilitadores de Produção Mais Limpa baseado em seminários de Pedagogia Social de base antroposófica do qual havia participado (cf item 5). O público, embora profundamente conhecedor do seu negócio (produção e acabamento de couro) possuía nível de escolaridade variado, indo de analfabetos a técnicos acostumados à intercâmbios com indústrias do exterior. Havia pessoas que estavam saindo de sua cidade pela primeira vez na vida.
O seminário foi planejado da forma mais orgânica possível, tendo como modelo um dos seminários de Pedagogia Social do qual havia participado em anos anteriores. As manhãs foram destinadas a atividade intelectual com a abertura dos trabalhos voltadas para uma atividade corporal. Todas as tardes após o almoço, foram realizadas atividades artísticas ou jogos cooperativos que respeitassem o processo digestivo e favorecem as relações humanas. O final do dia foi destinado a realização de uma tarefa que fizesse com que os participantes aplicassem o que aprenderam durante o dia de trabalho, sempre considerando a sua realidade dentro da empresa. A carga horária total foi de 40 h, em regime de imersão total, no Clube do Trabalhador, na cidade de Betim/MG. Participaram ao todo dezessete pessoas.
O curso foi desenvolvido e conduzido levando em consideração o conhecimento do processo pelos participantes, possibilitando minimizar os problemas que poderiam surgir relacionados ao baixo grau de instrução de alguns indivíduos. Os assuntos abordados durante a semana foram: contexto ambiental da produção do couro; Introdução a Produção Mais Limpa; Consumo de água e geração de efluentes; Resíduos sólidos; Fazendo Fluxogramas; A importância da negociação e planejamento; Balanço de Massa; Indicadores; Critérios de Priorização; Viabilidade Econômica; Sistemas de Gerenciamento Ambiental e Produção Mais Limpa; Auditoria.
Observe que os títulos foram bem técnicos, dignos de um curso técnico ou de engenharia. A maioria dos gestores são engenheiros e não reconhecem linguagens muito diferentes. A forma com que o conteúdo foi abordado, no entanto, utilizou estratégias educativas e participativas através de trabalhos em grupos, dinâmicas e debates, contemplando os seis aspectos da figura 1. Ao longo do curso, durante os debates e apresentação de trabalhos, os próprios alunos foram sinalizando oportunidades de produção mais limpa.
Alguns dos principais problemas apontados foram a grande geração de pó de rebaixadeira (resíduo classe I), o volume de efluente a ser tratado associado aos elevados valores das estações de tratamento, problemas relacionados a manutenção inadequada dos equipamentos (“gambiarras”) e problemas comportamentais dos funcionários particularmente relativos à higiene., organização e manutenção dos uniformes. As máquinas utilizadas no processo de curtimento são antigas e obsoletas, proporcionando um alto grau de perdas. Entretanto, as empresas que atuam no processo de acabamento possuem equipamentos mais atualizados, com bom nível técnico e perda reduzida. Várias oportunidades de melhoria foram também apontadas pelos participantes.
4.2 O caso da pequena empresa de manutenção em postos de gasolina
Em 2004 fui procurada por uma empresária bastante sensibilizada para a questão da sustentabilidade e descontente com o comportamento de seus empregados. Sua empresa de pequeno porte atuava na área de manutenção de postos de gasolina e ela desejava iniciar um processo de melhoria e conscientização ambiental na condução dos serviços e da apresentação dos empregados. As principais demandas trazidas pela proprietária da empresa eram: a. Conscientização em relação ao negócio da empresa no contexto da questão ambiental local e global; b. como fazer com que os seus empregados fossem mais organizados e zelosos, tivessem melhor apresentação?
A organização e zelo implicava desde o cuidado com a limpeza do veículo, o bom estado e organização das ferramentas até o cuidado com a aparência. A partir do briefing nasceu um pequeno programa baseado em três pilares: Ecologia Pessoal, Valores Humanos e Protocolo de Quioto. A ecologia integral é o referencial básico trabalhado pelo ONG Centro de Ecologia Integral, em Belo Horizonte, no qual são sintetizados princípios trabalhados pela Universidade da Paz. O conceito reúne as dimensões da ecologia pessoal, social e ambiental.
Este conceito, entrelaçado com a Educação em Valores (O´DONNEL, 1994), quando apresentado à empresária, despertou profundo interesse pois era um norte para as mudanças comportamentais que ela gostaria de ver em sua organização. Durante o trabalho foram apresentadas e debatidas as relações entre EA, qualidade de vida e questões ambientais globais com ênfase nas Questões Climáticas e Protocolo de Quioto. Foi feito a contextualização do negócio da empresa dentro do cenário ambiental global.
Após essa fase partiu-se para o trabalho com três perguntas-norteadoras:
1 – o que me deixa estressado?
2 – que me deixa relaxado?
3 – O que é possível programar?
Essa última pergunta referia-se às atividades que desempenhavam ao longo do dia. Eram perguntas diretamente relacionadas à geração de valor para o empregado. Comentarei a seguir as respostas referente à primeira pergunta e suas implicações – ver Tabela 2.
As perguntas foram respondidas individualmente para depois serem socializadas. Os participantes foram solicitados a propor soluções para cada tópico considerado como gerador de estresse. As opiniões foram sintetizadas e também socializadas. Todos participaram das atividades, a exceção da telefonista e um técnico que teve que fazer atendimento de emergência. Todos os atendimentos dos técnicos aos clientes foram programados respeitando a capacitação.
Essa é uma prática extremamente rara e muito difícil de fazer, pois implica em comprometimento absoluto do(a) dono(a) da empresa e, claro, no tipo de atividade que a empresa executa. Nesse caso, nós consultores temos que saber lidar e nos posicionar entre o que é ideal e o que é possível dentro da realidade apresentada.
As soluções apontadas levavam a três dimensões de questionamento e soluções:
I) Postura da Empresa – Era preciso que a empresária, junto com a pessoa encarregada de divisão de tarefas, revisse a distribuição dos atendimento no estado, evitando ao máximo do funcionário estar perto de Belo Horizonte e ter que voltar para outra cidade para fazer um novo atendimento. Também ficou claro a necessidade de treinamento dos tecnicos e substituição de alguns carros da frota. I
I) Postura dos tecnicos – Durante as discussões sobre os atrasos do atendimento, foi levantada a necessidade de alguns colegas de trabalho melhorarem sua performance no atendimento, pois eram considerados muito lento no atendimento dos chamados, causando atrasos sucessivos e gerando estresse a si próprios e a outros.
Também foi frisada a necessidade de cooperação entre todos. Outra necessidade evidenciada era de melhorar o cuidado dos técnicos com seus veículos de trabalho. Houve um debate sobre a influência da educação dos homens, particularmente em Minas Gerais, em relação a cultura da limpeza e do cuidado tanto com suas roupas, higiene pessoal quanto ao espaço de trabalho. Historicamente, tais costumes sempre foram atribuídos ás mulheres. Em pleno século XXI é necessário que homens e mulheres avancem sobre tal condicionamento cultural.
O cuidado é uma necessidade fundamental tanto para o bom desempenho junto ao cliente e quanto para a própria auto-estima. Houve uma discussão em torno de comunicação não verbal: que mensagem um carro organizado e um técnico de manutenção bem apresentado passava aos donos de postos de gasolina? O cuidado com os veículos de trabalho era de responsabilidade dos técnicos e implicava na limpeza e organização na disposição das ferramentas, na correta manutenção do veículo.
Não adiantava a empresa mudar a frota se o carro não tinha uma manutenção adequada. A manutenção dos carros, é, sobretudo, um exercício da coerência com o negócio da empresa: manutenção de postos de gasolina. Não é aceitável que uma empresa de manutenção não seja capaz de manter seus veículos em estado insatisfatório de manutenção. Outro ponto fundamental é que um veículo sem manutenção adequada consome mais gasolina, pode causar acidentes, impactando negativamente o ambiente. O cuidado com o carro era uma oportunidade de praticar a Ecologia Integral agindo local e pensando globalmente.
Para essas discussões, a participação das três únicas mulheres da empresa foi fundamental. Tais discussões também foram conduzidas parcialmente na ausência da empresária que propositalmente se ausentou dos trabalhos para que o público interno tivessem mais liberdade de expor sua idéias. III) Dimensão da Cidadania – Parte do problema em atender os clientes dentro do prazo estava relacionada ás condições das estradas no estado. Esse ponto levou às discussões sobre a condição das estradas estaduais e nacionais, ao uso dos impostos recolhidos e, em última instância, a questão do voto consciente.
Durante os debates brotaram perguntas importantes para o planejamento dos serviços e da filosofia de atendimento da empresa:
a) Podemos mudar o prazo de atendimento?
b) Podemos criar critérios para os prazos?
c) É vantagem dar o número do celular do técnico para o dono do posto?
Essa pergunta veio junto com a queixa de que alguns clientes ligavam exageradamente para os técnicos, sem necessidade. E por último uma das questões que considero mais profunda no trabalho: d) Quais são os critérios usados para atender as chamadas de urgências? Considero essa pergunta especial porque fez com que a empresa pudesse pesar entre a questão econômica e a questão ecológica e humana envolvida nos critérios.
Até aquele momento, os critérios usados para a definição de urgências eram: postos com vazamentos, clientes com riscos de acidentes, clientes chamados preferenciais por venderem mais e clientes que tinham apenas uma bomba ela quebrou. Quando chegou nesse ponto, fiz uma outra pergunta: e) considerando a questão do estresse de vocês, quais são os critérios justos? As respostas foram por unanimidade: vazamentos, riscos de acidentes e quando o cliente tiver uma bomba só e ela quebrar. A pressão exercida sobre a empresa tanto por si mesma quanto pelos clientes considerados preferenciais era muito grande. Ela precisava repensar a sua relação com alguns clientes para melhorar a sua performance com outros. Precisava também reduzir a sua própria carga de estresse. Todo o corpo técnico chegou junto a essa reflexão.
As soluções propostas e as perguntas levantadas ao longo do trabalham apontaram para a necessidade de reflexão e discussão internas, revisão do cálculo dos custos operacionais dos atendimentos, revisão dos termos dos contratos estabelecidos assim como possível levantamento e adoção de padrões operacionais que possibilitem melhor gerenciamento do negócio. Devido a demanda de trabalho da empresa e em parte por demandas pessoais da própria empresária, as últimas horas do curso não puderam ser executadas. Parte das soluções foram implantadas e, posteriormente, a própria empresária resolveu fazer um mestrado na área de combustíveis para aprimorar o seu negócio, melhorar o desempenho ambiental e a sua contribuição social.
4.3 Evitando o Greenwash
A forma com que as empresas foram e ainda são estruturadas, o uso de seus próprios recursos e a forma com que usa os recursos naturais, seus processos internos, sua cultura, vem sendo pressionadas a mudar para incorporar a variável da responsabilidade sócio-ambiental. Aqui merece destaque o trabalho do Instituto ETHOS de Responsabilidade Social, dirigido por Oded Grajew. Ele vem sistematicamente chamando as empresas à sua responsabilidade para com todas as suas partes interessadas: do acionista à comunidade. Infelizmente são muito poucas as articulações entre os setores de Responsabilidade Social e os Programas Ambientais. Estreitar essa relação é estratégico e facilitar esse processo é uma tarefa potencial de profissionais que trabalham com EdS.
Geralmente a empresa atua com esses dois setores de forma distinta, e, o que é pior, muitas vezes na moda da Responsabilidade Social, a empresa desperdiça dinheiro com investimentos muitas vezes discutíveis na área social, apenas por marketing. Arrisca sua própria marca nas armadilhas de um Greenwash (lustro verde). Por várias vezes em eventos nacionais Oded Grajew já chamou a atenção para os belos e caros relatórios de balanço sócio-ambiental que são apresentados para ninguém ler. O dinheiro empregado em ações embasadas em pesquisas tais como estudos de percepção ambiental pode trazer muito mais retorno para a empresa do que tais relatórios ou outras peças publicitárias. Estamos na era da reputação. E reputação, ao contrário da imagem, não pode ser comprada. Não basta parecer que investe em sustentabilidade, É preciso efetivamente investir e mostrar nas diversas ações dentro e fora da empresa.
O início do século XXI vem acompanhado de iniciativas que buscam humanizar as empresas e avançar sobre a cultura do comando e controle. Uma dessas iniciativas para a transformação da cultura reativa em cultura proativa é além do investimento na implantação de Programas Ambientais voltados para o Público Interno, em Programas de Desenvolvimento de Fornecedores e na própria educação dos consumidores. O desenvolvimento da cultura ambiental do mercado consumidor e da rede de fornecedores assegura a evolução da própria empresa. É o princípio de coevolução expandido aplicado à cadeia produtiva e ao pais.
Embora a Educação seja obrigação do Estado, as empresas brasileiras pagam muito caro por não terem pessoas com um bom nível educacional. As organizações que quiserem sobreviver e avançar não podem apenas esperar que o Estado cumpra a sua função. Dificilmente uma empresa poderá ter uma perspectiva de futuro próspero usando máquinas e tecnologias do século XXI sendo operadas por pessoas que pensam e agem com “cabeça do século XVII”. Devem, estrategicamente, investir na educação do próprio público interno e, numa perspectiva de cidadania empresarial, apoiar candidatos políticos que assumam e honrem compromissos com uma educação pública de qualidade.
- EdS, FORMAÇÃO DE LIDERANÇAS E GESTÃO DE PESSOAS
A EdS deve estar associada a outras áreas do conhecimento voltada para a gestão de pessoas e formação de lideranças. A forma predominante de administrar empresas utiliza um estilo piramidal de liderança herdado de exércitos e monarquias. No topo está o Presidente (General), seguido do Vice – Presidente (Coronéis), Gerentes Intermediários (Capitães e Tenentes), Supervisores (Sargentos) e finalmente os Empregados (Soldados, tropas). HUNTER (2004) ainda acrescenta um sexto nível na pirâmide onde inclui o Inimigo e, curiosamente, o Cliente.
Embora os clientes sejam a razão de existir de uma empresa, seus empregados trabalham para agradar principalmente ao “patrão”, ao seu superior. A empresa assim, deixa de servir às necessidades do outro para servir às vaidades administrativas, ao ego dos líderes. A empresa se organiza segundo uma forma de poder “de cima para baixo”. Os Programas de EdS devem contribuir para a mudança do modelo militar para um paradigma do servir, buscando alcançar o nível de equilíbrio entre a alma, a mente e o corpo da organização. Ao inverter o modelo piramidal surge o modelo do serviço. No triângulo invertido, o presidente serve ao vice, que serve aos gerentes intermediários. Esses últimos servem aos supervisores que servem aos empregados que, por sua vez, servem aos clientes. Assim como nos sistemas biológicos, cada nível organizacional cumpre sua função ecológica na organização e essa, por sua vez, serve à comunidade. O(A) líder deixa de ser aquele(a) que comanda, para aquele que serve. É alguém que identifica e satisfaz as necessidades legítimas – exigências física ou psicológica para o bem estar do ser humano – de seus liderados e remove barreiras para que possam servir/executar bem seus trabalho. Tal equilíbrio resulta em um ciclo vital e positivo formadas pela competitividade, rentabilidade e criatividade transformando empresas comuns nas chamadas empresas plenas (TRAJAN, 2000).
Outro importante contribuição para a atuação dentro do ambiente empresarial é dada pela Pedagogia Social – PS. A Pedagogia Social busca o desenvolvimento consciente do indivíduo e das organizações através da compreensão da educação humana e sua missão, além do reconhecimento e valorização das diferenças e sua importância para o funcionamento saudável do chamado organismo social. A PS atua em grupos e organizações de todos os setores e tem como um de seus pilares o olhar para os grupos ou organizações como seres vivos. Busca promover o desenvolvimento do próprio grupo a partir do estudo das relações entre desenvolvimento do grupo com o desenvolvimento dos próprios indivíduos que o compõe.
A PS foi desenvolvida pelo médico antroposófico Dr. Bernard Lievegoed, na Holanda, como uma das aplicações das idéias formuladas em 1919 pelo austríaco Rudolf Steiner sobre organização social. A PS chegou ao Brasil por meio de Pedro Smith, acionista e diretor da Giroflex (indústria de cadeiras e móveis para escritórios). O ser humano na visão antroposófica é constituído pelo corpo físico (órgãos), corpo astral (corpo de desejos para uma vida de sensações) e Eu (essência espiritual – consciência). A PS possui uma visão trimembrada do ser humano: o organismo é estruturado de três formas: neurosensorial, rítmico e metabólico. No sistema neurosensorial está o pensar, no rítmico o sentir e no metabólico o querer. Essa visão trimembrada permeia todas as áreas do conhecimento antroposófico tais como a medicina antroposófica, a Pedagogia Waldorf e a Agricultura Biodinâmica. A PS trabalha com o conceito de Trimembração Social. Dentro deste conceito, a sociedade se estrutura através da vida espiritual, com as vertentes educacional e cultural, da vida jurídica, com as vertentes políticas e social, e da vida econômica, com a produção, o consumo e a distribuição. Estes três membros constitutivos da sociedade obedecem aos ideais: liberdade para a vida cultural e espiritual (nível do pensar); igualdade na vida jurídica (nível do sentir/das relações) e no Estado; e fraternidade na vida econômica (nível do querer/agir).
Outra contribuição é dada pelo conceito SER (Sensibilização/Querer – Educação/Saber e Realização/Fazer) desenvolvido por Raimundo Soares, diretor do Instituto Orior de Pesquisa em Desenvolvimento Humano e Organizacional, professor e pesquisador do Núcleo Petrobras da Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral em Belo Horizonte/MG. De acordo com o conceito SER uma liderança mais adequada para alavancar o processo consciencial nas organizações precisa estar orientada para quatro dimensões do conhecimento: de si mesmo, das pessoas, da tarefa e do mundo. Dentro do conceito SER, na dimensão da Sensibilização/Querer, está a missão e o propósito da empresa, assim também como seus valores. Na dimensão da Educação/Saber, encontram-se o conhecimento das pessoas, o tecnológico, da tecnologia gerencial e o holístico. Na dimensão da Realização/Fazer encontram-se a organização e os diversos sistemas da empresa (marketing, desenvolvimento de produtos, produção, recursos humanos e financeiros). Tal conceito possui semelhanças à visão trimembrada utilizada pela Pedagogia Social. Somado a todo esse referencial teórico específico encontra-se a grande influência dos trabalhos do Físico Frijof Capra (CAPRA,1995; CAPRA, 1996; CAPRA 2002) que possuem contribuições significativas para um ecodesign de sistemas produtivos a partir da compreensão dos princípios de alfabetização ecológica (MUNHOZ, 2005).
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme dito na introdução, esse artigo é uma primeira tentativa de organizar minhas experiências e aprendizagens sobre a temática da Educação Ambiental em Empresas, porém sem a intenção de esgotá-lo. Esse assunto vêm gradativamente chamando a atenção no cenário nacional. A EdS pode contribuir para os negócios da empresa, ajudando na formação de seus profissionais, aumento da visibilidade e bom posicionamento da marca perante o competitivo mercado global, no controle de desperdício e aumento de produtividade.
É o tipo de trabalho interno que, quando bem fundamentado e desenvolvido, constitui um meio de aprimorar a relação tradicional entre capital e trabalho, transformando a empresa em uma organização mais humana, mais coerente com sua razão social de existência. A Conferência de Tbilisi define a Educação Ambiental como um processo permanente, no qual indivíduos tornam-se conscientes do seu ambiente e adquirem conhecimento, valores, habilidades, experiências e a determinação para agir individual e coletivamente, prevenindo e resolvendo problemas presentes e futuros.
Manter os processos permanentes é um desafio que as empresas ainda terão que vencer. Ao contrário de ações isoladas como comemoração do dia da árvore, semana do meio ambiente, etc, uma empresa que realmente incorpore a EdS em sua gestão, necessita de ter um programa estruturado no tempo e no espaço, baseado em Estudos de Percepção Ambiental de seu público interno, dotação orçamentária específica e profissionais capacitados para a realização e condução do mesmo.
A incorporação da EdS como um programa contínuo será mais rápida quando mais rápido o mercado das empresas internalizarem a sustentabilidade como um valor. Um dos maiores benefícios que um bom programa ambiental voltado para público interno proporciona é evitar o chamado “efeito soluço” também chamado “vaga-lume” do SGA – Sistema de Gestão Ambiental. A empresa que adota um bom Programa de Educação para a Sustentabilidade evita o desgaste e estresse das equipes de trabalho e mantém o comportamento de empregados o mais alinhado possível com a política ambiental da empresas.
No sistema de gestão convencional, a EA e a EdS são tidas como custo, mas à medida que o conceito de sustentabilidade e de responsabilidade social vai entrando na cultura e na práxis das empresas, passam a ser compreendidas como benefício. A empresa passa a adotar uma postura mais pró-ativa. A criação de termos de referência para Educação Ambiental nos processos de licenciamento ambiental configura-se como uma tendência no cenário nacional.
É urgente a necessidade de definição de critérios de qualidade, formas de avaliação e definição de indicadores para os trabalhos de prestadores de serviço e projetos. O diversificado mundo da iniciativa privada tem necessidades, culturas e dinâmicas próprias que precisam ser estudadas, compreendidas e respeitadas pelos profissionais que nela desejam atuar. A solução dos problemas e a complexidade do ambiente organizacional apontam para a necessidade de uma abordagem sistêmica assim como a da formação de profissionais com visão empresarial.
O desafio da EdS para empresas é, sem perder o foco do negócio, provocar mudanças de comportamento a partir do desenvolvimento da consciência e liberdade dos indivíduos associadas à implementação de oportunidades para a expressão de um comportamento saudável. A EdS, ao aumentar a capacidade de reconhecimento do ser humano nas diferentes esferas de poder organizacional busca simultaneamente não só contribuir para a alfabetização ecológica (CAPRA, 2002), a humanização das empresas, a autonomia dos indivíduos e conscientização dos riscos como também para a aplicação dos princípios ecológicos no planejamento das ações, desenvolvimento de produtos e serviços (Ecodesign).
Sendo a EdS um processo, a mudança cultural necessária para sair do comportamento reativo para pró-ativo também o é. A consciência e a liberdade de escolha em respeito à vida reconhecida a partir de si mesmo proporciona um resignificado nas relações empresa/ambiente interno – partes interessadas – capital. A empresa enquanto uma organização humana pode ser um espaço de aprendizagem do equilíbrio entre o Ser – Cuidado e o Ser – Trabalho (BOFF, 1999).
Programas educativos destinados ao público interno de empresas ainda são incipientes. Embora a Confederação Nacional da Industria tenha publicado importante documentos sobre a relação das industrias com o ambiente e entende que as indústrias têm sério papel a desempenhar pela responsabilidade sócioambiental para minimizar seu impacto ambiental negativo ao ambiente, ela mesma não reconhece a relevância da EdS. Como empresários e engenheiros gostam de dizer: não há como fazer um omelete sem quebrar os ovos. Não há como uma empresa tornar-se social e ambientalmente responsável sem passar por um processo profundo de Educação para a Sustentabilidade nem sem transformar radicalmente sua forma de produzir. Não é possível ser parcialmente sustentável. É impossível ser sustentável sozinho(a). Bem vindo(a) à era da cooperação.
- REFER%ENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOFF, L. Saber Cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. Petrópolis, RJ: Vozes,1999.
CAPRA, F. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1995.
_________. A Teia da Vida – uma nova compreensão científica dos sistemas vivos. São Paulo: Editora Cultrix LTDA, 1996.
_________. As Conexões Ocultas – ciência para uma vida sustentável. São Paulo: Cultrix, 2002.
HUNTER, J. C. O Monge e o Executivo – uma história sobre a essência da liderança. 14a ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.
MOGGI, J. Gestão Viva! A célula como modelo de organização. São Paulo, SP: Gente, 2001. 111p.
MUNHOZ, D. Alfabetização Ecológica: das pessoas às cadeias produtivas. IN: Layrargues P. P., (Coord.), MMA/DEA. Identidades da Educação Ambiental Brasileira. Brasília: MMA, 2004; p. 141-155.
PENTEADO, H. Ecoeconomia – uma nova abordagem. São Paulo, SP: Lazuli Editora, 2005.
O’Donnel, K. Raízes da Transformação – a qualidade individual como base para a qualidade total. 2a ed. Salvador: Casa da Qualidade, 1994.
TRAJAN, R. A.” A empresa de corpo, mente e alma”. São Paulo, SP: Gente, 2001.